Psicose e laço social - Esquizofrenia e paranoia na cidade dos discursos

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Desde sua publicação, em 2006, até hoje, 2023, este livro fez um longo percurso e a vida deu muitas voltas — passamos por um período de trevas com a extrema direita no poder e o fascismo à brasileira nas ruas e nas redes a comando do capital devastando as aquisições democráticas, dentre as quais algumas ligadas à reforma psiquiátrica e ao movimento antimanicomial. As consequências foram desastrosas como, por exemplo, o desenvolvimento das Comunidades Terapêuticas de cunho moral, religioso e prisional antinômicas ao tratamento médico-psicológico, que leva em conta o sujeito e sua inserção nos laços sociais. Estamos ainda, no início da nova era Lula, longe de ver saneada a situação do atendimento aos usuários da Rede de Atenção Psicossocial no Brasil. Mas a via já está sendo retomada e esperamos que este livro em sua nova edição possa contribuir no caminho de incluir os foracluídos dos discursos.

Para a minha alegria, este livro foi e continua a ser uma referência, para além dos consultórios de psicanalistas que não recuam diante da psicose, em vários CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), onde as pessoas fazem leituras e discussões em grupos de estudo utilizando seus desenvolvimentos teóricos para auxiliar na condução de casos clínicos. E para a minha grata surpresa ele foi traduzido e publicado em espanhol, francês e turco. E tive a honra de ter sido convidado para seus lançamentos respectivamente em Buenos Aires, Paris e Istambul.

Passados os 17 anos desde sua publicação, gostaria de fazer um panorama da pesquisa que me orientou para escrever este livro propondo uma resenha de seu percurso.

Este livro se inicia com uma Introdução em que mostro a distinção entre uma psiquiatria baseada em estatísticas em uma concepção neuronal do ser humano e um diagnóstico orientado pela psicanálise que considera o sujeito do desejo. Oponho assim uma psiquiatria dos transtornos e dos fármacos, como a atual, com uma psiquiatria clínica que considera que os sintomas e fenômenos rementem à uma estrutura subjetiva. E que o tratamento não deve focar em eliminar de chofre os sintomas daqueles que recebemos, mas sim de acolher esses sintomas e fazê-los falar, pois eles são a expressão do sujeito sofredor.

Na parte 1, sobre a teoria dos discursos em Lacan, mostramos como se dá de forma diferenciada o tratamento na medicina, na psiquiatria e na psicanálise através de laços socais distintos, os quais se referem a um momento bem preciso do ensino de Lacan. É preciso mostrar como se dá no ensino de Lacan a passagem do Campo da linguagem para o Campo do gozo, o qual é estruturado pelos quatro discursos (ou laços sociais) que constituem nossa sociedade. E mostro o remanejamento dos conceitos já conhecidos, tais como o sujeito ($), o significante mestre (S1), o saber (S2) e o objeto a. A partir de então, passo à descrição detalhada desses quatro elementos e dos lugares que eles ocuparão em cada discurso: do mestre, do universitário, da histérica e do analista. Mostro também como e porque Lacan foi levado a estabelecer um quinto discurso que ele considera preponderante em nossa era: o discurso do capitalista. Nessa nova elaboração passamos, portanto, do campo da linguagem para o campo do gozo e da função da fala para a função do ato — o discurso como laço social é considerado um discurso sem palavras. E, por fim, a partir desses novos pressupostos, mostro como podemos abordar o Édipo no Campo do gozo. Assim, temos a diferença entre a abordagem da psicose no campo da linguagem (a foraclusão do Nome-do-Pai) e no campo do gozo (fora-do-discurso). A ética da clínica da psicose no campo dos laços sociais me faz propor uma direção de tratamento que deve seguir as seguintes preliminares no intuito de não excluir o sujeito — como foi feito por séculos dentro da lógica manicomial —, e sim de inclui-lo no laço social: incluir o sintoma no diagnóstico, o sujeito no tratamento e também a foraclusão. Desse modo, podemos passar do binômio exclusão-reclusão para o binômio foraclusão-inclusão. Entretanto, assim como Freud alerta aos psicanalistas de se absterem do furor curandi, alerto aqui contra o furor includente. Não há clínica sem ética. Isso implica em responsabilizar o sujeito e respeitar suas escolhas.

Na parte 2, são abordadas as diferenças entre os dois tipos da psicose, esquizofrenia e paranoia, de forma bem resumida nas três dimensões do espaço psíquico: Imaginário, Simbólico e Real. E já se aponta aqui a tese central deste livro, que é a diferença no registro Simbólico entre esquizofrenia e a paranoia: enquanto na primeira há uma dispersão de significantes e a ausência do Um que representaria o sujeito, na segunda há uma Verhaltung, um retenção de um significante-mestre (S1) ao qual o sujeito fortemente adere.

Proponho então um retorno à psiquiatria clássica da esquizofrenia com Kraepelin e Bleuler. Entre os dois, ficamos com Bleuler, que introduz uma causalidade na psiquiatria situando a esquizofrenia como uma resposta do sujeito a um evento significativo de sua vida. É muito impressionante lermos hoje os clássicos da psiquiatria e percebermos o quanto aprendemos com sua clínica refinada e escuta apurada — foi o que detectamos com os famosos “4 As” de Bleuler para descrever a esquizofrenia: o autismo (fora-do-discurso); as associações (fenômenos na fala de falta de basteamento, quebra de cadeia significante, automatismo metal etc.); afetividade (rigidez, falta de investimento libidinal de objeto); ambivalência (a esquize a céu aberto). A partir da tese freudiana de que o delírio é uma tentativa de cura (da foraclusão estrutural), proponho uma generalização: todos os fenômenos psicóticos são uma tentativa de cura do autismo, uma forma de fazer vínculo com o outro como tentativa de representar o sujeito, de fazer com que a linguagem morda seu corpo; da arte como tentativa de cura, conforme o testemunha Bispo do Rosário, entre outros.

Retomo agora o que para mim foi um grande achado da minha pesquisa da qual resultou este livro: a especificidade do mecanismo da paranoia que a distingue tanto da esquizofrenia. Trata-se da Verhaltung que traduzo por retenção — termo que tomei de Kretchmer, autor da psiquiatria clássica que foi uma referência utilizada por Lacan em sua tese, Da psicose paranoica e suas relações com a personalidade. Ambos os tipos clínicos no interior das psicoses estão sob o regime da Verferfung, foraclusão do Nome-do-Pai, mas enquanto na esquizofrenia temos a dispersão de significantes e. consequentemente, do gozo e a incidência no corpo do despedaçamento imaginário, na paranoia há a retenção de Um significante-mestre tendo por consequência uma identificação imediata do sujeito a esse significante-mestre, o que possibilita o sujeito ser representado por aquele significante e assim entrar nos discursos como laços sociais. Por outro lado, a retenção de um S1 explica a tendência megalomaníaca do paranoico de se achar o único, o number one, o indivíduo especial e, por conseguinte, encontramos, como aponta Freud, muitos paranoicos como líderes e chefes de seitas. A retenção é também um indicador lógico para o tratamento psicanalítico da esquizofrenia, no sentido de acompanhar o sujeito em suas tentativas de se deixar representar por algum significante que possa esvaziar o gozo que o invade.

A partir da premissa da retenção como mecanismo específico da paranoia, retomo a relação do paranoico com o registro Imaginário — considerado por Lacan da ordem de um visco, um grude, uma cola — e retorno à psiquiatria clássica com Sérieux e Capgras, que consideram a paranoia como uma patologia da interpretação. Além disso me sirvo do conceito de Lacan de “conhecimento paranoico” para apreender a “paranoia crítica” de Salvador Dali e ainda proponho considerar como seu paradigma o personagem Simão Bacamarte em “O alienista”, de Machado de Assis. No desenvolvimento que se segue, desmonto a estrutura do que encontramos na paranoia como um “empuxo-à-fama”, no qual o olhar do Outro se infinitiza e se presentifica de forma constante. E, por fim, a partir do que Lacan elabora na última parte de seu ensino, passo à mostração do nó paranoico, que é o “nó de trevo”, em que encontramos uma continuidade entre os três registro R, S e I e entre as modalidades de gozo.

Na parte final deste livro, revisito o caso freudiano do Homem dos lobos, a partir de seu episódio de paranoia e sua análise com Ruth Makc Brunswick, para reler o caso através da foraclusão do Nome-do-Pai e de sua posição de objeto de gozo do Outro, dos fenômenos hipocondríacos e do efeito de análise que lhe conferiu um nome e uma possibilidade de se inserir no laço social: Homem dos lobos. Em seguida, trabalho a história biográfica de John Nash (e seus fenômenos psicóticos), escrita por Sylvia Nasar, para mostrar sua solução como “tentativa de cura” que não foi nem pela via do delírio nem por via da arte, e sim por meio de uma longa e árdua elaboração matemática até encontrar o que consideramos ser sua equação singular.

Por fim, no último capítulo deste livro, proponho problematizar a inimputabilidade criminal do sujeito julgado “doente mental” decretada por nosso Código Penal para que aquele que é considerado um “doente mental” seja tratado como um sujeito de desejo, da história e de direito, tendo, portanto, direito de julgamento e de defesa por seus atos. Em outros termos, trata-se de uma consideração para  que possamos viver numa sociedade em que todos tenham deveres e direitos iguais sem preconceitos e sem julgamento prévio, e que possam circular pela pólis, a Cidade dos Discursos, sendo responsáveis por sua fala, suas escolhas, sua história e seu atos.

                                                                                    Antonio Quinet,

                                                                                    Armação de Búzios, 17 de abril de 2023

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